quarta-feira, 13 de julho de 2016

Sou o esquecimento

Sou o esquecimento que um dia sei que vou ser. Só me lembro do que me esqueço, a não ser quando olho para as cicatrizes do amor ou dos muitos amores que já vivi, e me marcaram, a ferro em brasa, e me marcaram bem mais que alguns momentos de ódio que também já me assaltaram e me fizeram pensar que eu nunca tinha espaço para erros ou imprevistos. Tudo me pode acontecer, até esquecer-me que me esqueci porque há em mim uma certa moral anarquista.
O zero é mais ou menos qualquer coisa, porque ser zero já é ser qualquer coisa. E lembro-me daquele cachimbo pintado por  Magritte, em que ele diz "isto não é um cachimbo". Mas é, ou é o seu contrário ? Às vezes os relâmpagos, que sendo momentaneamente a ausência de escuridão, como que escrevem mensagens num alfabeto muito próprio, mas que me fazem perguntar, por exemplo , o que é a escuridão? o que é o preto? e me lembro de Wittgenstein quando escreve as Anotações Sobre as Cores ou por exemplo o Livro Azul ou o Livro Castanho. E é quando o relâmpago me faz sentido ao atear fogo à contraditoriedade. E esqueço-me, porque a noite cai nos meus pensamentos e eu deixo de os ver porque sou o esquecimento disso tudo, que sinto, e por isso, só por isso, existo.
E porque sou esquecimento digo-me coisas por paráfrases, porque me escondo atrás de uma interpretação desse texto que é o relâmpago em si mesmo, mas com palavras minhas, ou de uma metáfrase que é um termo que no seu todo não pode ser sintaticamente reestruturado de uma classe gramatical para outra. E eu também não sou mais que um termo, uma palavra de que me esqueço quando sou o esquecimento de mim mesmo.

1 comentário:

Unknown disse...

Nossa é assim que me acho. Isso é doideira eh?