domingo, 22 de novembro de 2009

ERA UMA VEZ

Era uma vez um rapaz, sonhador e idealista. Lia muito e era apaixonado por tudo o que fosse bom e bonito. Um esteta, em suma, porque importante para ele não era só o que via, mas sobretudo o que sentia. Já Almeida Garrett dizia que "beleza não é formosura; beleza é o resultado das graças". E o belo, no que tem de mais profundo, desde sempre tinha despertado nele os sentimentos mais diversos. Sempre tinha tido amigos e amigas a quem se entregava de corpo e alma. Tudo vivia segundo o kalos kay agathos (o belo e o bom da velha Grécia). Mas nem sempre foi compreendido e aceite. Por outro lado sempre teve amigos e amigas que o acompanharam pelo resto da vida.
E aquele rapaz um dia, e mais uma vez, apaixonou-se. E dessa vez foi para valer. Ainda por cima ela tinha muitos irmãos e irmãs, o que para ele foi uma festa, um deslumbramento e um encantamento, já que só tinha um irmão e isso o fazia sentir-se muito só.
Casou, e ao casar casou também com o resto da família, que achou ser um prolongamento da sua. Por fim podia ter muitos irmãos. Amou-os muito, mas se calhar como dizia uma actriz de cinema daquele tempo e que ele gosta sempre de citar, o problema nunca foi amar muito, foi o nem sempre saber amar sabiamente. Não contava, - e se calhar ainda hoje não aprendeu completamente a lição - , que as pessoas às vezes não são nada como ele, sonhadoras e idealistas. Pelo contrário, são frias, egoístas, calculistas. E ele quando se apercebeu que a vida não era como ele a sonhava, viu-se maltratado, desprezado, vilipendiado por quem menos esperava. Restava-lhe, - e o que sempre foi muito - , o grande Amor que ao longo dos anos foi construindo com a Mulher, feito de aceitação, entendimento, respeito pelas diferenças, mesmo por aquelas aparentemente mais difíceis de ultrapassar. Sentiram-se muitas vezes sozinhos, isto é, caiam muitas vezes na tentação de pensar isso, mas viam sempre, por uma razão ou por outra, que Deus nunca os tinha abandonado. Assim uma espécie dos conhecidíssimos "passos na areia". Uma das suas características ou defeitos, entre muitos, era a impulsividade, e ao sentir-se traído chegou a sentir uma grande raiva, a pensar em torpes vinganças, mas o Amor vence montanhas, em especial o Amor entre eles os dois. Ela muito mais serena, muito mais sensata, foi sempre capaz de o pacificar e de o fazer pensar que perdoar quer dizer "dar duas vezes" e ele, em boa verdade, só se tinha dado sempre uma vez. E ele aceitou. Por Amor. E achou que valia a pena, porque importante, importante era o Amor que viviam um com o outro e um no outro, já rodeados de Filhos e Netos. E o rapaz, que de rapaz já não tinha nada, aceitou ter perdido uma família ao ver melhor que Deus o tinha compensado com a sua própria Família, construída pelos dois, ultrapassando muitas vezes mil e um obstáculos, e quase tão grande como a outra. E em Amor, sem sombra de dúvidas, muito maior. Não sei se ele vive assim tão em paz como gostava. Mas e o que é a paz? Ausência de guerra ou a sua procura?
Meu amor, os teus olhos azuis-agua, lavam todas estas manchas que tantas vezes insistem em me sujar o coração. Não, não me vingo. Basta-me o teu Amor.

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