sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Há meses

Há meses que não escrevo nada neste meu blog de que tanto gosto. Mas tenho andado a pensar e de hoje não passa acrescentar nele mais qualquer coisa.

E lembrei-me de que o meu Pai me ofereceu "As Canções" de António Botto, quando eu fiz 10 ou 11 anos, disso é que já não me lembro bem e que para além da muita poesia que releio sempre, António Botto é sem dúvida quem mais releio. Tenho para mim que é do melhor que se tem escrito em Portugal, não só a poesia, como os contos e as cartas. Não é de certeza por acaso que o muito mais celebrado Fernando Pessoa se lhe refere em cartas que lhe escreveu pelo "meu mestre". Dentro da poesia, os sonetos são tão extraordinários, tanto os dedicados à "mulher morena" como os que dedica ao "jovem loiro", que os próprios ingleses, sempre tão ciosos do que é seu, o comparam a Shakespeare.
Mas hoje, não sei porquê, estou a pensar mais nas "cartas que me foram devolvidas", porque também estes textos/apontamentos, que por aqui vou pondo e começaram por ser uma tentativa da tradição diarística, que afinal não cumpro, mas que acabam por ser, embora às vezes com grandes espaços no tempo, uma longa e interminável carta que não me canso de escrever e que penso nunca acabarei enquanto for vivo, uma carta que me escrevo, que a mim devolvo sempre, e que no fundo não deixam de ser pequenos gritos calados de uma maneira muito minha, de me revoltar contra a ignorância e a teimosa pequenez das pessoas que continuam a não dizer o que pensam, o que sentem ou que na realidade mais crua, afinal são. Uns pobres "palhaços articulados", sempre com a cara enfarinhada para melhor esconderem por trás dessa máscara que faz rir os outros, as lágrimas que por trás delas lhes escorrem secas pela cara abaixo e em que ninguém vê nem adivinha as suas "humanas desventuras".
Esta carta que já escrevo há anos é feita de muitas cartas que só não me são devolvidas, porque sou eu próprio quem mas devolve até antes mesmo, de as mandar. E não digo a ninguém que as escrevo. Que adivinhem, se quiserem.

Sem comentários: