domingo, 26 de novembro de 2017

Foi meu professor

Edgar Morin a certa altura intitulou-se "contrabandista de saberes". Também eu hoje me sinto a fazer contrabando daquilo que vou sabendo, para passar aos outros o que penso ter para lhes dar. Não me importo de ir por caminhos de pé posto, atravessar a vau as ribeiras do desencontro, andar perdido pelas serras raianas, pedregosas e onde os espinhos me rasgam a carne, sem saber se a estreiteza do caminho está entre as rochas e penedos ou nos abismos que às vezes me vão ladeando, sempre com medo de morrer sem sequer ter ainda nascido. Mas insisto sempre em levar a minha carga aonde penso que ela esteja a fazer falta. Tenho tido pelo caminho imensos percalços e não foram poucas as vezes em que saí humilhado e ofendido, batido, não só pelos ventos agrestes mas pelas mãos dos homens, roubado, não por salteadores vulgares que de mim querem a bolsa, mas por muitos outros que gostavam de me ver só, caído no buraco fundo da verdade. E volto tantas vezes aonde fracassei, quantas vezes fujo dos lugares de onde saí vitorioso. As trevas não me assustam, porque tenho sempre comigo as estrelas que nunca me perguntam para onde vou e o que levo comigo. E são a vela que acendo não tendo assim que amaldiçoar a escuridão.
Edgar Morin foi meu professor numa pós graduação já aqui há um bom par de anos. Entre os muitos livros que li dele - escreveu umas dezenas - lembro-me agora de "Os meus demónios"
que sempre me faz pensar nos meus, com quem aliás não me dou tão mal como isso, porque também não posso estar sempre a rezar aos anjos bons. Em tudo cada vez mais penso que tenho é que conseguir a harmonia dos contrários, e é por isso que também não me importo de subir ao cimo das montanhas, porque de lá de cima consigo distanciar-me tanto do bem como do mal.

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