segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Terra

É na terra, ao remexer na terra, que encontro tudo e me encontro em tudo. É na terra, que tudo alimenta, que nela nasce e renasce, tudo. Do que ela deu para alimentar a Mãe que me pariu, ao nascer para ela, porque voltarei para ela, para a alimentar de mim, e voltar a ser outro, um dia, nela.
É na terra que vivem os espíritos, nos lagos e nos rios, nas árvores e na relva das pradarias, e no vento que pode encapelar as águas dos mares e abanar as florestas. É no cantar dos pássaros que eles habitam, nas lamas das margens dos rios, nas areias das praias e dos desertos, no relinchar dos cavalos a pastar nas montanhas, nos gritos das mulheres em parto. Porque tudo é terra. E ela está sempre em trbalho de parto.
Os espíritos vivem sem precisar de viver. São, apenas. E quando lhes sorriu, sei que nos entendemos e que juntos sonhamos coisas, que só um ao outro somos capazes de dizer.
E é por eles, pelas histórias que me contam, que eu sei que a vida não acaba na morte, porque só acaba quando os outros nos esquecem. Aqui na terra.
E então protejo-me da morte nos silêncios que faço, para poder estar com eles, e fujo dos tambores que a rufarem os acordam e afastam, porque se assustam, habituados como estão ao silêncio e os fazem ir para outras terras.
E deixo-me ir com o vento, que me dá forças, me alimenta e faz viver, ao fazer-me respirar, andar, dizer coisas que me confortam, neste meu egoísmo, e me fazem olhar para tudo o que é belo, e fazer amor com tudo o que amo, e sentir-me confiante ao saber que todos eles esperam por mim, com paciência e amor. E com todo o tempo do mundo. Com todo o tempo da terra.
E pus-me a ouvir o 2º andamento da sonatina para piano de Schubert, e depois, já mais calmo pus-me a ouvir o 2º concerto de Serguei Rakmaninov, que ele dedicou ao seu psiquiatra pela ajuda que lhe deu para sair da depressão profunda em que ficou após a estreia desastrosa da sua 1ª sinfonia. E senti-me mais com os pés na terra.

Sem comentários: