quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Noites e dias

E fiquei com os olhos cheios de noite, e senti-me livre do passado. Nascia de cada vez que me ia lembrando de ti, nascia para ti e para mim, sempre a recordar-me de quando "tinha rasgado o ventre a minha Mãe".
E foi assim que fui nascendo, hoje por uma coisa, amanhã por outra. Nascia só por nascer, só porque sim. E voltava a ser pequeno, frágil, indefeso, dependente. E como cada nascimento é sempre uma separação, eu ia nascendo para me ir separando de tudo. Até de mim, que afinal não conseguia encontrar em parte nenhuma. Mas ia-me separando da vida, do mar, de mim.
E a noite caíu-me em cima, como uma faca assassina, e rasgou-me os pensamentos como quem rasga lágrimas por chorar.
Depois olhei-te e vi lá no fundo uma alvorada. E a estrela da manhã foi o Sol que me aqueceu a dor de te perder.


Pensei nuns poemas de Antero. Em muitos. E também arranjei um castelo. Com uma porta pequena, bem pequena, por onde tive que entrar todo curvado, a lembrar-me da pequenez humana.
E parti por paisagens de antes de mim, de antes dos homens, e fui dizendo poemas, uns atrá dos outros, como quem sabe de cór uma oração, como quem sobe escadas para poder por fim descançar na tua mão direita.
E senti vergonha do meu cansaço. E deixei que uma chuva miudinha me molhasse até aos ossos.

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