quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Como é que

Como é que a vida pode ser felicidade? Penso que li isto em qualquer lado mas não me lembro onde. Mas retive na memória não sei porquê. E procuro pegar nas mais pequenas pistas, nas palavras chave, a ver se descubro. Mas só tenho nuvens na minha memória.
E lembrei-me de Beethoven quando dizia que a música era capaz de reproduzir na sua forma real, a dor que dilacera a alma e o sorriso que inebria. E sim, sei que foi ele quem disse isto, mas não sei quando nem porquê. E folheio pautas e livros de notas, como um qualquer rato de biblioteca,  para ver se lhe encontro um sentido ou se a posso integrar num qualquer contexto.
E senti-me um pisteiro dos meus tempos de África, a tentar ser capaz, de a partir do resto de uma pegada ou de um pequeno tronco partido, perceber o trajecto que um animal segue, que tipo de animal é, se vai a fugir de mim ou a tentar envolver-me para melhor me atacar num descampado.
Mas é, não basta contemplar tudo isso que um rasto me possa descrever, como não me basta contemplar uma obra prima para a compreender, porque preciso de sentir o que ela me faz sentir, e o que terá sentido quem a pintou, ou escreveu, ou compôs.
É por isso que a morte mesmo que escreva o meu nome pelo meu próprio punho, não passa de um grito, que lhe posso arrancar do que de mais profundo haja em mim, mas que não entendo, nessa maravilhosa contradição, nesse contraste indefinido que me desenha as formas, mas não me desenha nem a vida nem a morte. Apenas me desenha a sensação.
E dou comigo a falar com um Deus cego, surdo e mudo num absurdo pairar como uma abelha, não à volta de uma flor mas de uma poderosa melodia, que entoo num profundo abandono ao meu cansaço de há tanto tempo me contemplar num sonho feito dos mistérios que mil espelhos me fazem sentir, ser muitos e nenhum outro a não ser o próprio sonho feito de mim.

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